Antes do show em Maceió com João Bosco, Toquinho fala de Vinícius, Sertanejo e até João Dória

Agendaa 9 de junho de 2017

por Rodrigo Cavalcante

Em 9 de julho de 1980, três dias após completar 34 anos, ele testemunhou a morte de Vinícius de Moraes (então com 66), com quem chegou a realizar cerca de mil shows em 10 anos de parceria – ou de um “casamento que tinha tudo, menos sexo”, como gostava de dizer o poeta.

A menos de um mês de completar 71 anos (5 anos além da idade de Vinícius quando morreu), o paulistano Antonio Pecci Filho, contudo, parece manter o mesmo vigor, tom de voz e jeito afável do jovem Toquinho, como era conhecido o menino que estudou violão clássico e logo descobriu a riqueza da música brasileira ao se enturmar com jovens como o carioca Chico Buarque.

Antes do show nesta sexta ao lado do cantor e compositor João Bosco (às 21h, no Teatro Gustavo Leite, no Centro de Convenções, com abertura da cantora Wilma Araújo), Toquinho falou a AGENDA A sobre a parceria com o poeta, o que restou da MPB, música sertaneja e até da sua admiração por João Dória.    

AGENDA A: Os biógrafos de Vinícius dizem que quando o poeta, em 1970, convidou você, então com 23 anos, como parceiro, ele foi mais uma vez se reinventar para não viver de glórias passadas. A menos de um mês de completar 71 anos (cinco a mais do que Vinícius quando morreu), o que você faz para não viver do passado?

Difícil comparar, porque não apenas o tempo é mutável, como também, é claro, éramos seres humanos bem diferentes. Por um lado, Vinícius era não apenas um poeta já consagrado, como era um homem com experiências fascinantes por ter vivido como diplomata em Los Angeles, Montevidéu, Paris, enfim, tinha um know-how de vida que foi fundamental na minha formação, ainda mais nos meus 23, 24 anos. Por outro, Vinícius, aos 56 na época, conseguia ser bem mais jovem do que eu em várias circunstâncias. Acho que a parceria foi bem sucedida também porque, enquanto ele me deu toda sua vivência e preparo como poeta, eu me dedicava muito no violão para lhe entregar uma série de melodias, uma atrás da outra, que lhe permitia se concentrar na composição de letras que resultaram em 130 canções e em mais de 100 shows que fizemos juntos. Da minha parte, procuro me manter aberto e com uma postura humilde para sempre aprender, treinando e tocando ao menos três horas diárias de violão e produzindo novas canções, como as 11 músicas que acabo de compor em parceria com o Paulo César Pinheiro (poeta e compositor autor de mais de mil canções como Canto das Três Raças, Viagem, Nomes de Favela). Até na hora de lançar um novo trabalho, precisamos nos adaptar, já que não faz sentido hoje, por exemplo, lançar um CD. Daí que já estamos pensando em novos canais e formatos de distribuição. Enfim, tento sempre acompanhar e me adaptar, sem sacrificar qualidade.

Por falar em mudanças e qualidade musical, quem você gosta de ouvir que tenha surgido nos últimos anos?  

Gosto de muita gente. Como hoje é bem mais fácil gravar um CD, termino recebendo uma infinidade de obras de novos artistas. Claro que tem muita gente ruim, até porque hoje qualquer um pode gravar, mas também tem gente muito boa. A Verônica Ferriani, com quem dividi palco e canta comigo até hoje, por exemplo, a Camilla Faustino (lançada no programa Quem Sabe Canta, de Raul Gill), com quem também me apresentei. Enfim, a cada geração sempre surge grandes talentos.

Você citou duas cantoras, mas em relação a novos compositores…

De fato, é difícil comparar com o período de ouro da música brasileira que começou bem antes da minha geração, mas, que ainda tivemos oportunidade de vivenciar. Aquele foi um momento único de convergência cultural de pessoas que se orgulhavam do Brasil, que queriam fazer arte brasileira, não apenas na música, como no cinema, com Glauber Rocha. Já havia, claro, influência dos Beatles e de outros grupos, mas optamos pela batida diferenciada de um João Gilberto. Antes, a geração de João Gilberto já tinha sido marcada também pela influência de grandes compositores como Noel Rosa, Pixinguinha. Difícil comparar, até porque vivíamos também outro momento político, de um Brasil bonito, que tinha projetado outra imagem no governo JK, bem diferente da política atual.

Por falar em política, você, diferentemente de compositores como o Chico Buarque, por exemplo, sempre transitou entre políticos de vários partidos. Como você sobrevive em meio à polarização política atual?

Sou, antes de tudo, contra qualquer radicalismo. Aprendi, nesse tempo, que a esquerda pode ser mais radical do que a direita. Em 1983, por exemplo, quando fui convidado a receber um prêmio de melhor canção por Aquarela no Chacrinha, não é que dois amigos meus, bastante conhecidos, foram me pressionar para que eu não fosse à premiação? “Você não vai lá receber, né?”, disse um deles. “O Chacrinha apoia o Maluf!”. Ora, se o Chacrinha apoiava o Maluf, assim como a Hebe Camargo apoiava o Maluf, esse era um direito deles. Disse a eles que essa atitude de cerceamento era bem parecida com a dos generais do regime que eles se contrapunham.

Eles hoje estão…

Nem adianta perguntar, porque não vou dizer quem eram (risos). Da mesma forma, respeito e acho fantástico que o Chico tenha liberdade total para se posicionar sem ser cerceado por ninguém. Isso é que importa, é primordial. Já eu odeio partidos, acho que são todos iguais, o PT, o PSDB, o PMDB, todos estão enlameados. Acredito em pessoas, e cada vez mais poucas.

Em quem?

Hoje, no Meirelles (ministro da Fazenda), no Raul Jungmann (atual ministro da defesa), Álvaro Dias (senador do PV do Paraná). Também conheço e admiro como empresário o João Dória. Mas, não acredito em partidos.

João Dória é um dos nomes do PSDB mais fortes à presidência e os outros nomes que você citou e estão em um polo político oposto, por exemplo, ao do Chico Buarque, que foi hostilizado…

Não, não me considero em um polo político oposto ao Chico. Acho até nobre da parte dele manter-se próximo daqueles que já não estão por cima. Do meu lado, pegaria o lado bom de Lula, o lado bom de Raul Jungmann, do Meirelles, do Alvaro Dias, do Dória, que é um empresário que conheço há uns 30 anos e sempre foi muito profissional, trabalhando de sol a sol. Enfim, acho que há também muito preconceito no Brasil não apenas contra presidente operário, mas também contra empresários, como se fosse pecado ser rico no Brasil. Claro que não estou falando dessa turma da JBS que detonou uma bomba no país e foi viver no exterior. Estou falando de pessoas que apostam no Brasil, que pensem primeiro no Brasil e não apenas no seu interesse ou interesse do partido.

Em algumas entrevistas, você elogiou alguns compositores da música sertaneja. Sofreu alguma crítica?

Olha, se tem uma coisa que me alimenta na vida é a possibilidade de entrar e tocar em qualquer lugar com parceiros de diversos gêneros, seja de ícones do jazz, como um Sado Watanabe (saxofonista japonês), seja com o João Bosco, grande parceiro como no show que faremos nesta sexta aí em Maceió, seja com o Renato Teixeira, compositor sertanejo. Não tenho vergonha de admitir que me emociono até com aquelas canções sertanejas mais populares. Admiro a potência de voz, com aquela rouquidão, de um Leonardo, por exemplo, que canta sempre com muita emoção. Acredito na simplicidade musical. Para mim, música boa é aquela que a gente assobia. E, convenhamos, a MPB também teve sua fase chata, pretensiosa. Sempre procurei a simplicidade, o que não quer dizer pobreza musical. Não é à toa que as músicas de um maestro como Tom Jobim ainda hoje são assobiadas por aí.  

Serviço:

SHOW DO ANO, de Toquinho e João Bosco

 Show de abertura: “Com Buarque, com afeto”, de Wilma Araújo. T

Teatro Gustavo Leite. Sexta (09/06), 21h.

Ingressos na Loja Fórum (Ponta Verde): R$ 180/ R$ 90 (mezanino), R$ 230 / R$ 115 (plateia B), R$ 270 / R$ 135 (plateia A).

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Mais informações: (82) 98192-4000.

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