A “despedida” de Ricardo Mota: o que está acontecendo com os grupos de comunicação em Alagoas

Agendaa 18 de agosto de 2021

Ricardo Mota (acima):  empresas de comunicação do Estado perdem relevância ao não investir em jornalismo

 

por Rodrigo Cavalcante

 

Ricardo Mota trabalha pela notícia. Não para ser notícia.

Por volta de meio-dia desta terça, 17 de agosto, a postagem em seu blog “Uma Despedida” no site TNH1 sobre sua “saída” do Pajuçara Sistema de Comunicação virou inevitavelmente notícia e apanhou de surpresa milhares de leitores (e ouvintes na rádio) que acompanham há anos as opiniões e análises do jornalista. 

“É uma despedida sem traumas e cheia de gratidão, da minha parte”, escreveu o jornalista.

Sem traumas, talvez, para o próprio Ricardo.

Não, contudo, para o jornalismo e as grandes empresas de comunicação.

A demissão de Ricardo Mota (e não “desligamento”, para evitarmos eufemismos que o próprio repudiaria) é um sintoma claro da desorientação dos grupos tradicionais de comunicação no Estado.

Diante da falta de estratégia para se adequar ao novo cenário digital e perdas crescentes em publicidade, a opção mais fácil das empresas a curto prazo tem sido, não só em Alagoas, reduzir custos do jornalismo.

Como o bom jornalismo tem custos mais altos do que os de produções populares  sensacionalistas (onde apresentadores conseguem fazer o tempo render bravando pseudo-polêmicas), o conteúdo de qualidade tem sido o primeiro alvo de corte das empresas.

O alívio a curto prazo no fluxo de caixa, contudo, ameaça as empresas com outro tipo de rombo: o da irrelevância.

Irrelevância que os grandes grupos de comunicação do Estado, até agora, parecem não se importar.

Dois anos antes da demissão de Mota, os dois maiores grupos de comunicação do Estado (a Organização Arnon de Mello e o próprio Pajuçara Sistema de Comunicação) deram sinais claros disso ao demitir (ou tirar da frente das câmaras de TV) dezenas de profissionais de imprensa que participaram da greve dos jornalistas profissionais contrários à proposta de redução do piso salarial da categoria.

Na crença de que puniam os jornalistas grevistas, esses grupos puniram, na prática, a audiência. 

Uma boa parcela dessa audiência, claro, pode até  não saber exatamente qual o motivo do “desaparecimento” de alguns de seus apresentadores e repórteres favoritos. Em vez de reclamarem, contudo, a maioria apenas deixa de acompanhar o seus canais com a mesma frequência — e investem o tempo em outras redes.

Mal comparando, seria como se uma grande vinícola, após uma greve de seus empregados, abdicasse de seus melhores profissionais para produzir um vinho de qualidade inferior torcendo para que seus clientes não percebessem a diferença. 

Os clientes, claro, percebem.

Assim como irão perceber o vazio deixado pela demissão de Ricardo Mota.

O impacto não virá, como alguns calculam, em perda de popularidade.

Mas virá, com certeza, em perda de credibilidade, poder e influência – ativos sem os quais um grande grupo de comunicação se torna ainda mais vulnerável (principalmente em véspera de ano eleitoral).

Mota, como escreveu em sua despedida, pode até ter saído “sem traumas” – e tem motivos para isso, já que a tecnologia lhe dará outros meios para recomeçar.

Traumática, contudo, permanece a situação dos grandes grupos locais de comunicação: enquanto a Organização Arnon de Mello acumula dívidas milionárias e luta para sobreviver em meio a uma recuperação judicial, a concorrência, em vez de aproveitar o momento para investir em relevância, permanece desorientada buscando soluções simplistas. 

Soluções, cujo desfecho mais provável, será a tentativa futura de venda dos ativos que restarem a grupos capitalizados de outros Estados – por um valor, se nada for feito até lá, ainda menor.