Economista Zeina Latif diz onde Alagoas precisa investir para alavancar economia

Rodrigo 2 de maio de 2024

 

Economista Zeina Latif em palestra em Maceió com o tema “Perspectiva Econômica e Futuros Possíveis” /  Foto: Julio Vasconcelos

Com passagens pelo setor público e privado (de ex-secretária de Desenvolvimento de São Paulo a ex-economista chefe da XP Investimentos), Zeina Latif é uma das economistas mais respeitadas no Brasil na análise dos entraves do crescimento do país, sejam fiscais, políticos, judiciais e de cultura institucional.

Convidada pelo Sebrae Alagoas para apresentar terça passada (30) uma palestra no Fórum de Negócios Novas Fronteiras, na Associação Comercial, com o tema “Perspectiva Econômica e Futuros Possíveis”, a economista falou no final do evento com AGENDA A sobre o que Alagoas, com a previsão do fim da guerra fiscal após aprovação da Reforma Tributária, pode fazer para alavancar sua economia — e depender menos de verbas do Governo Federal.

Você aponta que a disparidade entre Estados e regiões é um dos entraves do crescimento do Brasil, mas também considera esgotados modelos de fomento de desenvolvimento criados no passado como os que resultaram na Sudene. O que Alagoas, que permanece tendo um PIB menor do que o de Piracicaba, deve focar para depender menos de programas federais?

Insisto sempre na importância do capital humano. Seja para Alagoas ou qualquer Estado. Mesmo São Paulo, por exemplo, no início do século passado, tinha indicadores educacionais ruins, assim como em todo o Brasil. No entanto, houve um investimento significativo em educação, impulsionado inicialmente pela riqueza gerada pela agropecuária, o que permitiu que até mesmo pessoas de origens humildes, como minha mãe, pudessem se beneficiar de uma educação de qualidade e tivessem mais tarde a chance de estudar na Universidade de São Paulo. Sei que Alagoas melhorou alguns indicadores na Educação, mas essa é sem dúvida uma área em que ainda há muito que avançar.

Além da educação básica, as regiões mais pobres do sul dos Estados Unidos também investiram em universidades e centros de pesquisa de referência para atrair indústrias. Essas instituições também não têm um papel decisivo para atrair empresas?  

Sim, universidades e centros de pesquisa são cruciais para alavancar o desenvolvimento, mas é preciso também que essas instituições sejam criadas com foco na resolução de problemas locais e se tornem referências nas vantagens competitivas de cada Estado. O Instituto Butantan, que hoje é uma referência nacional e até internacional, nasceu inicialmente de uma demanda local para resolver os problemas dos agricultores que eram vítimas de picadas de cobras venenosas. Como não há recursos ilimitados para todos os segmentos da Educação, é preciso garantir melhores indicadores na educação básica e fazer com que as instituições de ensino superior sejam mais voltadas para resolver problemas locais e alavancar os segmentos com maiores vantagens competitivas de cada Estado.

Esse seria o caso do turismo aqui em Alagoas?

Sim, podemos usar o turismo como exemplo, mas adianto que não falo aqui como especialista da área, até porque não conheço em profundidade os desafios do turismo no Estado. Vou falar como alguém de fora, que também faz turismo. Sobre o capital humano, por exemplo, é preciso se perguntar: a mão de obra local está suficientemente preparada, fala inglês? Estamos investindo, de fato, na formação de qualidade de pessoas para atender os visitantes? Temos pessoas formadas para projetar a cultura local, a culinária, as artes? Temos indicadores do que precisa ser feito para oferecer um serviço de excelência baseado em pesquisas que indiquem qual a visão do turista quando vem aqui, e se estão satisfeitos com o serviço? Enfim, é preciso ter coragem para avaliar, pôr o dedo na ferida, reconhecer áreas vulneráveis, inclusive de deterioração ambiental, para decidir de fato onde é preciso investir. 

Com a previsão do fim da guerra fiscal entre Estados após a aprovação da Reforma Tributária, Alagoas e outros Estados do Nordeste não poderão usar políticas de isenções para tentar atrair indústrias. Como esse novo cenário vai mudar as políticas de desenvolvimento do Estado?

Sim, mas isso também obriga os Estados e municípios a assumirem a responsabilidade para criar novos estímulos locais e rever legislações atrasadas. Do ponto de vista urbanístico, por exemplo, será que não dá para estimular com um desconto maior no IPTU aquele sujeito que quer reformar o seu prédio histórico, assim como fez Lisboa? Mesmo em São Paulo, apesar de todos os problemas urbanos e críticas, houve avanços no Plano Diretor que estão atraindo investimentos para alguns bairros após a melhoria de regras que facilitam, por exemplo, o retrofit de prédios antigos, o que incentiva o turismo. No caso de Maceió, será que o potencial turístico do Centro Histórico está sendo bem aproveitado? Será que os cursos de História nas universidades locais estão preparando pessoas para criar atrativos nesses locais? Enfim, estou insistindo em exemplos ligados ao turismo por ser uma vocação clara de Alagoas. Mas há exemplos aqui próximos, como o Porto Digital de Recife, que conseguiu aliar o estímulo ao empreendedorismo à recuperação de vários prédios do Centro Histórico. Enfim, com um diagnóstico claro das vocações do Estado e tendo coragem para investir nessas vantagens comparativas, há muito que ser feito.